Esse post não é um estudo antropológico e sexual da vida dos recifenses. É apenas um registro da produção cinematográfica filmada em Recife, capital de Pernambuco e do frevo. Três ótimos filmes foram lançados tendo como musa inspiradora essa cidade tão cheia de curiosidades e peculiaridades: A Febre do Rato, O Som ao Redor e Era Uma Vez Eu, Verônica.
Os três são filmes que usam o elemento do sexo não como uma forma escrachada ou fora de contexto, mas como uma parte do dia a dia de todos. A Febre do Rato é pura poesia em preto e branco. Mostra a Veneza brasileira de uma forma diferente dos que visitam a cidade ou que moram nela conhecem. As favelas na beira do rio, o passeio de barco e o centro da cidade ganham novas cores, dentro dos matizes do P&B. A poesia é gritada aos sete ventos e amor é a mola compulsora do poeta que anda pela cidade pregando sua arte e enquanto produz um jornal artesanal, curte o amor diferente pelas mulheres fora do padrão de beleza e por sua paixão platônica, que desperta e instiga ainda mais a produção do jornal. E é em nome dessa arte, que ele enfrenta uma forte oposição daqueles que não querem que a verdade política seja dita. E para ilustrar mais ainda isso, o sexo aparece como uma das partes principais da narrativa do filme. Ele não é o mote principal como pode parecer, mas é um componente na química da narrativa. Que o diga o "tonel" do amor e a chuva dourada. No entanto, é tudo encaixado e interligado na película.
O segundo filme da trilogia recifense é O Som Ao Redor. Outra bela produção inspirada por Recife e seu mar. Nele, o que chama a atenção é a proximidade das situações. Nada a ver com as loucuras da cabeça dos folhetins de Glória Perez. Nesse filme, as coisas que acontecem, realmente acontecem de verdade e é isso que faz a platéia amar ou odiar o filme. Saber que os ocorridos podem acontecer com seu vizinho ou com você mesmo perturba, porque quem assiste quer fugir da realidade e não encará-la. Tudo se desenvolve numa rua de classe média alta de Recife, em que uma espécie de coronel é dono de grande parte (ou todas) das casas do logradouro. A ação se desenrola em cima dessa rua e de seus moradores, suas manias, suas neuroses e o seu sexo. Tudo temperado pelos sons que cercam as situações cotidianas, desde o latido do cachorro ao barulho do mar. De novo o sexo aparece, mas como coadjuvante e não como chamariz. Que o diga a função da máquina de lavar.
Pra fechar a trilogia, temos Era Uma Vez Eu, Verônica. O retrato da indecisão e do sentimento de não ter direção da recém formada Verônica. Mais uma vez temos o mar como descarrego para as emoções e o sexo como válvula de escape. E Recife mostrada de uma maneira muito interessante. Esse dia a dia, com as reclamações dos pacientes no consultório de um hospital público, a doença do pai, assumir um relacionamento e as dúvidas em seguir ou não a profissão são os elementos da narrativa do filme. E para embalar tudo isso, temos uma personagem não romântica e ligada ao sexo casual, sem compromisso. Tudo se desenrola de maneira que em alguns momentos se pensa que estamos assistindo a um documentário. Sem falar na narração desabafo da protagonista. Verônica é uma pessoa sensual e sexual. Que o diga o "boiar" no mar no começo do filme.
Antes que comece aquela velho clichê de que o cinema brasileiro só tem sexo, é melhor ir devagar com o andor que o santo é de barro. Essa trilogia recifense é basicamente sobre a vida que todas as pessoas levam, com todos os elementos que a permeiam, inclusive o sexual. É o mostrar de realmente tudo o que acontece, sem pormenores ou pudores. Os 3 filmes foram feitos para serem apreciados e debatidos. E para constatação de que a realidadedo dia a dia também atrai. E que gera boas obras como essas citadas. Assistam e deleitem-se.
Por Sandra Martins.